A USP é uma espécie de solo sagrado para corredores paulistanos – principalmente aos sábados.
Lá, a partir já das primeiras horas, hordas de atletas amadores começam a se apropriar de suas ruas e alamedas, transformando o cenário na mais pura energia.
Não poderia haver palavra melhor, aliás: aos sábados, os 8km de extensão do percurso parecem ser uma usina de energia gerada por corredores e ciclistas e destinada exclusivamente a alimentar os seus próprios humores. Todos, afinal, parecem ficar imersos em um mundo próprio, com pensamentos se movendo na velocidade das passadas.
Há outros locais assim em Sampa, claro: o Ibirapuera, por exemplo, é praticamente a segunda casa de milhares e milhares de corredores. Mas o dia de longão mesmo é aos sábados: dia em que horas são passadas na rua, em que tarefas do trabalho não amassam o tempo, em que se pode realmente curtir cada gota de suor derramada.
E, para longões, poucos lugares são melhores do que a USP.
No meu trajeto cotidiano, parto de casa e vou correndo até a Cidade Universitária. Desço a Cidade Jardim, cruzo Brasil e Faria Lima, viro à direta na Marginal e cruzo a ponte sobre o Rio Pinheiros pela Rebouças.
Fato: o cheiro ácido do rio não é o ponto alto do dia, assim como as reuniões de travestis encerrando o turno na outra margem. Mas tudo isso passa logo.
Em instantes já se está no superarborizado Butantã e cruzando os portões da USP, onde corredores parecem sair de cada canto.
Somando ida e retorno até a minha casa, consigo variar entre 21km e 24km de corrida (considerando uma volta na USP). Mas o visual é tão perfeito que, às vezes, é fácil aumentar para 2, 3 voltas ou mais, ampliando o longão e melhorando o preparo para alguma prova qualquer.
Há ainda um segredo bem guardado lá dentro: em uma pequena rua, já na parte alta do percurso e logo antes da Rua do Matão, há uma espécie de mini-floresta cercada por grades. Pode não parecer mas, por trás de vans de assessorias esportivas e de grupos de corredores batendo papos há um portão que sempre fica entreaberto. Se passar por ali, entre.
Em um piscar de olhos, tudo muda. O asfalto vira uma trilha acidentada, os gramados e parques se transformam em árvores gigantes e fechadas, o vento cessa e dá espaço a um clima abafado, quente. Besouros cantam um zunido ensurdecedor enquanto mosquitos fazem a festa nas pernas que estão passando por ali.
OK: a descrição pode não ser, exatamente, convidativa. Mas pense de outra forma: para quem curte trilhas, descobrir um mundo novo e súbito com ares de floresta fechada é inspirador.
A saída da mini-floresta é quase a Rua do Matão. A partir dali é encarar o quilômetro de subida em um clima mais ameno, gostoso, respirar a vista da cidade do alto e descer de volta até o portão.
Dá para entender porque a USP é tão sensacional para quem curte correr: poucos lugares conseguem ser perfeitos para todos os gostos e ainda perto do centro.
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