Dias 2 e 3: Pelo lado de dentro

Não consegui “descansar” ontem: já pela manhã troquei o day-off por 10K entre a vila e a praia, desbravando territórios e paisagens novos. Difícil convencer a mente de ficar quieta, desistindo de comandar as pernas, quando se está em cenário tão convidativo.

Mas queria variar um pouco, deixar as trilhas de areia fofa para trás nem que fosse por um punhado de tempo. Há mais para se ver no Nordeste do que areia e mar, afinal.

Hoje cedo, com 15K de meta, tomei o rumo da vila de Fortim. Peguei a pequena estrada de areia que saía do hotel e fui até o asfalto por uma reta só. Era cedo, antes das 6:30, e tudo parecia uma espécie de versão diurna, clara, da mais densa noite. Nenhuma alma atravessava o caminho e o silêncio era cortado apenas pelo assobio do vento e chacoalhar das árvores.

Na primeira vila, uma igrejinha antiga imobilizava o tempo. Sua pintura era tão caricaturalmente gasta que, somada às casinhas pobres no entorno e aos distantes latidos de vira-latas, desenhava um cenário absolutamente sertanejo.

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Atravessei e segui em frente, pelo asfalto. Ainda era cedo mas, mais longe do litoral e da brisa, o calor começava a apertar. No caminho, campos abertos pontilhados apenas por árvores mais resistentes à aridez desenhavam o horizonte. Uma ou outra cedia suas preciosas sombras para casebres pobres, com as portas entreabertas deixando à mostra uma escuridão úmida com ares de eternidade.

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Mais adiante, os primeiros sinais da vila de Fortim apareciam em forma de menos campados e mais casas – todas, no entanto, no mesmo estilo centenário, como que inspiradas em uma arquitetura portuguesa que qualquer um ali dificilmente conhecia. As casas, a vila, as pequenas praças e as igrejas pareciam ter sido plantadas naquele cenário há tanto tempo quanto o próprio mundo.

Depois de uma praça com um busto dourado de alguém que deve ter enriquecido a partir da miséria alheia – único motivo pelo qual monumentos são erguidos no interior nordestino – um velho mirante se prostrava, igualmente abandonado. Fui até lá: a vista era de tirar o fôlego.

Dois banquinhos sentavam sob a sombra de árvores frondosas, olhando atentamente ao Rio Jaguaribe que, lá longe, cortava dunas de areia branca e desembocava no mar azul. Impressionante.

IMG_0274 IMG_0273Não sentei nos banquinhos, mas fiquei ali, parado, quase que me eternizando na paisagem.

Depois saí.

Uma velha sertaneja varria sua calçada, tirando a mesma areia que, minutos depois, certamente voltaria carregada pelo vento. Bares já começavam a abrir, juntamente com mercadinhos e portas que entregavam à vila crianças em busca de diversão.

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Era uma terça-feira qualquer perdida no final de julho: quente, úmida, com ares de cotidiano naqueles interiores. A vida, de uma vagarosidade impressionante, começava a andar enquanto eu corria de volta para o hotel.

Estava na hora de entrar no ritmo da metrópole ditado pela Internet e pela interminável lista de tarefas que incluíam apresentações, conference calls via Skype, pilhas de emails e Whatsapps para dar conta.

A aceleração do dia-a-dia paulistano parecia, àquela altura, impressionantemente distante da realidade – mas já me chamava em alto e bom som.

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