Dia 7: Gravando a última impressão

Mar e dunas ontem, cidade hoje. Por algum motivo, há qualquer coisa que sempre me encantou em pequenas vilas que parecem congeladas no tempo.

Fora algumas anomalias urbanas superpopuladas, repletas de violência e miséria pútrida, o interior nordestino é essenclamente cheio delas.

A região do pontal não é exceção.

Saí hoje tão cedo que a lua cheia ainda reinava absoluta no céu que apenas começava a se riscar com os primeiros tons de azul claro. Era sábado, dia mais parado que os já calmíssimos habituais, mas algum movimento se ensaiava.

Mulheres de vestido de renda varriam areia para longe de suas varandas, homens olhavam o sol que sempre viam com um ar de tedioso espanto, crianças e cachorros faziam os primeiros barulhos do dia.

A pobreza da região era óbvia – mas era também resignada, calma, quase que conivente com sua própria falta de perspectiva.

Era uma pobreza de tudo: dinheiro, conforto, futuro, vocabulário. Curiosamente, ela se equilibrava com o outro extremo: a abundância de paisagens, de dunas, de oceano, de azul do céu e de vida que cismava em proliferar naquele naco abandonado do mundo.

No caminho, estradas se abriam em frente a igrejas de todas as faces cristãs, ruelas se esgueiravam por entre céu e terra, carnaúbas se erguiam do mato, brisas teimosas quebravam, ainda que por instantes, o já insuportável calor nordestino.

Olhei para tudo aquilo diversas vezes: para os rostos castigados mas leves dos locais, para as casas mal pintadas, para as pracinhas bucólicas e para toda a natureza que se sobressaía superlativa.

Gravei cada milímetro na mente.

Era essa a última impressão que queria levar de volta para São Paulo amanhã.


  

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