Oficialmente meu tempo ainda não saiu – mas fiz os 80 duríssimos quilômetros em um pouco mais de 16 horas!
Duríssimos – mas de uma beleza inesquecível.
A começar pelo clima de largada de ultra trail, com pouco mais de uma centena de corredores devidamente equipados com mochilas, iluminação noturna, poles e aquele olhar que só quem está prestes a encarar um dia de pura aventura e desafio porta.
Depois, logo que o sol nasceu nas montanhas do Douro, começou o espetáculo. As primeiras descidas e subidas eram dentro de vinhedos – algo mágico justamente nesta época, quando as colheitas começam e há cachos de uva para todos os lados. Alimento perfeito para trilhas, aliás.
Depois vieram paisagens diferentes, como uma ponte feita pelos antigos romanos que era parte do percurso. Foi como correr pela história, gerando picos de endorfina.
Até aí, tudo foi relativamente leve. Mas veio a subida do Marão, maior montanha do percurso com 1.430 metros de subida. Um dos trechos, de um quilômetro, era tão íngreme e sem apoio que alguns corredores pararam para vomitar e dois se lesionaram ao ponto de terem que abandonar a prova.
O topo, no quilômetro 34, viu mais algumas desistências. Natural dada a dificuldade, agravada pelos quase 30 graus e um sol forte brilhando no céu.
Quem continuou, foi até o fim: correndo de posto de controle a posto de controle. No meu caso, fui embalado por Coca-Cola e biscoitos de maizena servidos neles, mais uvas dos vinhedos e água, reabastecendo a mochila em fontes das pequenas aldeias que pontilhavam o percurso.
Dores vieram e foram. A gripe que apareceu na véspera e que, embora leve, persistia ainda na largada, foi deixada ao longo do percurso.
Amigos foram feitos no caminho. Vistas ficaram presas para sempre na retina.
Difícil esquecer a paisagem do Douro, patrimônio da humanidade pela UNESCO, ou as tantas aldeias antigas da região.
Ao chegar próximo ao final, avistar a cidade da Régua toda acesa já por volta das 21:30 foi também inesquecível. Chegaria à meta cerca de 40 minutos e uma descida quase sádica depois.
E cheguei inteiro, inclusive em um estado bem melhor do que em Comrades. Os pés estavam marcados por bolhas e dores, claro – mas as pernas, o resto do corpo e o ânimo, intactos.
Hoje, domingo, depois de uma noite bem dormida, é hora de curtir o efeito prolongado da realização de uma ultra – principalmente desta, meta final de um treino que durou três longos e suados meses.
Sensação de missão cumprida, de auto-realização, de orgulho.
E de ter captado paisagens e sensações que certamente levarei por toda a vida.






















